TRIBUNAIS  SUPERIORES - JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA


RECURSO ESPECIAL Nº 250.285 - MG (2000/0021375-6)  - DJ 02.12.2002


RELATORA:       MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE:  CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF 
ADVOGADO:     JOSÉ GOMES DE MATOS FILHO E OUTROS
RECORRIDO:     LUCAS ANTUNES 
ADVOGADO:     PAULO EMÍLIO RIBEIRO DE VILHENA E OUTRO

EMENTA 

Direito do Trabalho. Recurso Especial. Caixa bancário. Caixa Econômica Federal - CEF. Função de confiança. 
- O cargo de caixa da CEF não se classifica como função de confiança, tal como concebida pela CLT. 
- Recurso especial não provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Os Srs. Ministros Castro Filho, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. 
Brasília (DF), 07 de novembro de 2002(Data do Julgamento) 
MINISTRA NANCY ANDRIGHI 
Relatora 
RECURSO ESPECIAL Nº 250.285 - MG (2000/0021375-6) 
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

RELATÓRIO 

Cuida-se de recurso especial interposto por Caixa Econômica Federal - CEF, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. 
Lucas Antunes ajuizou reclamação trabalhista em face da ora recorrente. Narrava que fora admitido como escriturário, pela empregadora-ré, em 09/02/1976, e, em 1977, assumiu o cargo de caixa, passando a receber uma gratificação. Em 1980, foi destituído do cargo de caixa, unilateralmente, pela empregadora. Requeria o pagamento das gratificações perdidas pelo ato unilateral da CEF e suas repercussões econômicas. 
Julgado improcedente o pedido, o autor, ora recorrido, interpôs recurso ordinário, ao qual o Tribunal a quo deu parcial provimento, a fim de restabelecer, em favor do reclamante, o pagamento da gratificação de caixa executivo a partir de 13 de agosto de 1981, com repercussão nas férias, décimos-terceiros salários, gratificações semestrais e depósitos do FGTS. O acórdão recorrido está assim ementado, no que interessa: 
"TRABALHISTA. ECONOMIÁRIO. JORNADA DE TRABALHO. CAIXA EXECUTIVO. INEXISTÊNCIA DE FUNÇÃO COMISSIONADA. 
(...) 
II- Não tendo a função de Caixa Executivo natureza comissionada, mas sim técnica (Enunciado 102 do TST), a gratificação paga por seu exercício não pode ser suprimida unilateralmente, pena de nulidade (CLT, art. 486). Precedentes" (fl. 161). 
Daí o presente recurso, no qual se afirma malferido o art. 468 da CLT, além de dissídio jurisprudencial, inclusive com entendimento do STJ (REsp 120.417), pois a função de caixa bancário é de confiança e, por isso, aquele que a exerce pode ser destituído, a qualquer tempo, pela empregadora. 
Admitido o recurso especial na origem, vieram os autos a esta Corte e foram distribuídos originalmente ao em. Min. Eduardo Ribeiro (fl. 191). Após retornar o processo do Ministério Público Federal, com parecer, o feito foi-me atribuído, com conclusão em 28/08/2000 (fl. 198). 
Por entender que a matéria estaria dentro da competência da e. Terceira Seção, proferi despacho enviando os autos à Subsecretaria de Autuação Classificação e Distribuição de Feitos (fl. 199). O recurso foi então distribuído ao em. Min. Felix Fischer, que suscitou conflito negativo de competência, resolvido pela e. Corte Especial no sentido de declarar competente a e. Segunda Seção (fl. 216). 
É o relatório. 

RECURSO ESPECIAL Nº 250.285 - MG (2000/0021375-6) 
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

VOTO 

A questão federal consiste em saber se o desempenho das atribuições de caixa bancário pode ser considerado como exercício de função de confiança. 
Inexiste conceito legal sobre a chamada função de confiança, adotando a Justiça do Trabalho, como norte, o art. 224, § 2º, da CLT, que assim dispõe: 
"Art. 224. A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana. 
§ 1º (...) 
§ 2º As disposições deste artigo não se aplicam aos que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes, ou que desempenhem outros cargos de confiança, desde que o valor da gratificação não seja inferior a um terço do salário do cargo efetivo." (negritou-se). 
O e. TST, ao analisar vários casos de empregados bancários, decidiu não ser necessário que a função de confiança implique em poder de gestão (como define o art. 62, II, da CLT), mas que pode ser caracterizada por aquelas outras atribuições mencionadas no art. 224, § 2º (RR 2.230/83, Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Farias Mello; RR 4469/83, RR. 4044-79, Rel. Min. Mozar Victor Russomano). A orientação restou sumulada no Enunciado n. 204: "As circunstâncias que caracterizam o bancário como exercente de função de confiança são previstas no art. 224, § 2º, da CLT, não exigindo amplos poderes de mando, representação e substituição do empregador, de que cogita o art. 62, 'b', consolidado". 
Portanto, entende-se que a função de confiança não é somente aquela conferida a gerente, subgerente, etc., podendo ser exercida em relação a outros cargos. 
Todavia, a Justiça Especializada também não deixou ao arbítrio da empregadora fixar as atribuições que entenda como de confiança e, especialmente no tocante ao caixa bancário, anotou que não se trata de função de tal natureza. Extrai-se de precedente do TST (RR 2082-76, Rel. Min. Alves de Almeida), os seguintes motivos: 
"O cargo de caixa de banco é cargo de natureza especial, face à maior responsabilidade inerente ao seu exercício, porém, não contendo os requisitos configuradores de cargo de confiança, (...)" 
Posteriormente, editou-se a Súmula 102/TST, na qual se baseou o acórdão recorrido, e que tem o seguinte conteúdo: "O caixa bancário, ainda que caixa executivo, não exerce cargo de confiança. Percebendo gratificação igual ou superior a um terço do salário do posto efetivo, esta remunera apenas a maior responsabilidade do cargo e não as duas horas extraordinárias além da sexta". 
Com efeito, é necessário que se estabeleçam parâmetros para o enquadramento do cargo como de confiança, em homenagem ao Princípio Protetivo, pilar do Direito do Trabalho, interpretando-se restritivamente o art. 224, § 2º, da CLT, já que o exercício desta função acarreta a restrição de direitos trabalhistas. 
Essa foi a preocupação do em. Min. Dias Trindade, Relator do REsp 12.656/RJ, DJ, que assim anotou, em seu voto: 
"O parágrafo único do art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho, ao criar exceção à regra da inalterabilidade do contrato de trabalho, faz alusão ao 'exercício de função de confiança', deixando à doutrina a sua definição. 
Não é, deste modo, porque alguém exerce cargo ou emprego em comissão que se dirá que seja esse um caso de 'exercício de função de confiança'. E nem cabe à empresa, em sua organização definir como de confiança essa ou aquela função, o que levaria, por certo, à burla das disposições protetivas do trabalhador, incidente a regra do art. 9º da CLT, que tem por nulos de pleno direito os atos com o objetivo de 'desvirtuar', impedir, ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos nesta Consolidação'." 
Seguindo-se a idéia contida no art. 224, § 2º, da CLT, o cargo de confiança deve implicar em algum poder de chefia, de autonomia das decisões ou (não necessariamente) representação do empregador. Entre bancários, a presença de subordinados ou de poder de concessão de empréstimo, por exemplo, denotam o exercício da função de confiança (Perrini, Valdyr A. L."O Cargo de Confiança Bancário e a Jurisprudência Predominante do E. TST - Abordagem Crítica" in RTRT/9ª Reg., V.11, n. 2, 1986, p. 87). 
O cargo de caixa bancário não implica qualquer poder de mando sobre subordinados, não contém autonomia para decidir sobre qualquer questão referente aos serviços internos ou àqueles prestados diretamente aos clientes. 
Também assim considerou o em. Min. Dias Trindade, no referido precedente, in verbis: 
"Daí porque, orientou-se a doutrina e, com ela, a jurisprudência trabalhista em definir como de confiança o exercício apenas daquelas funções de mando, com autonomia na própria exteriorização da vontade da empresa, situação que está longe de ser aquela do caixa-executivo, que se limita a efetuar pagamentos e recebimentos mediante a verificação da conformidade dos respectivos documentos de recolhimento e de saques, para cujo exercício não se exige fidúcia maior do que aquela que qualquer empregado deve a seu empregador, como bem disse, em acórdão no TST, o Ministro WASHINGTON TRINDADE, convocado, em substituição, nestes termos: 
'CARGO DE CONFIANÇA. BANCÁRIO. CAIXA EXECUTIVO. NÃO CONFIGURAÇÃO. 
A fidúcia do caixa executivo é idêntica a de qualquer bancário, cujo contrato de trabalho supõe maior lastro de confiança, sem configurar, contudo, qualquer função ligada ao estado-maior empresarial.'(TST-Pleno - DJ 24.08.79)." 
De fato, inexiste motivo para que se caracterize a função de caixa como de confiança, pois o simples fato de ter maior responsabilidade, lidando diariamente com somas de dinheiro, não é suficiente para caracterizar o denominado cargo de confiança, tal como concebido pela CLT. 
Conseqüentemente, aqueles que exercem a atribuição de caixa bancário devem ser considerados empregados comuns, titulares do direito previsto no caput do art. 468, da CLT ("Nos contratos individuais do trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia."). 
Não se pode deixar de registrar que esta e. Terceira Turma, ao julgar o REsp 120.417/RS, DJ 11/05/1998, Rel. Min. Waldemar Zveiter (mencionada pela recorrente como paradigma), proferiu acórdão assim ementado: 
"TRABALHISTA - JORNADA DE TRABALHO DO ECONOMIÁRIO - HORAS EXTRAS - FUNÇÃO DE CONFIANÇA - CAIXA EXECUTIVA - NEGLIGÊNCIA DA RECORRIDA - MATÉRIA DE FATO. 
I - A JORNADA DE TRABALHO DOS ECONOMIÁRIOS É DE 8 HORAS, NÃO LHES APROVEITANDO OS ARTS. 224 E 468 DA CLT. 
II - O EXERCÍCIO DA FUNÇÃO DE CAIXA EXECUTIVO CARACTERIZA-SE COMO DE CONFIANÇA, PODENDO SER RETIRADA SEM QUE OCORRA ALTERAÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO DE TRABALHO. 
III - O DESCONTO DE IMPORTÂNCIA, EFETUADO NA CONTA DO RECLAMANTE, NÃO FOI ILEGAL, DE VEZ QUE ELE SE DEU PARA REPOR PREJUÍZOS CAUSADOS Á RECLAMADA POR NEGLIGÊNCIA DO RECORRIDO. 
IV - MATERIA DE FATO. 
V - RECURSO NÃO CONHECIDO." 
Contudo, ao ler-se o relatório e o voto proferido pelo em. Min. Relator, nota-se que não houve, de fato, exame detido sobre a natureza da função de caixa. Assim colhe-se dos fundamentos do decisum: 
"Quanto à eventual infringência aos textos legais o recurso também não propende ao acolhimento. 
Na verdade, o equacionamento jurídico dado à hipótese pelo aresto recorrido resultou das questões fáticas aferidas pelo eminente Relator, observando os aspectos legais que regulam esse contrato de trabalho bancário e atento ainda às regras do Quadro de Pessoal da Reclmada (CEF). 
Essa matéria, como assim explicitada, não é suscetível de reexame em sede de Especial (Súmula 07/STJ). 
Ademais, o eminente Relator, ao deduzir a hipótese, modelou-se por aresto do ex-TFR e a recorrida demonstrou verdadeira essa assertiva, tanto que, daquela Corte, confirmando o direito aplicado pelo acórdão, apresenta, os seguintes precedentes: 
Fls. 526/528: 
'TRABALHISTA. JORNADA DE TRABALHO. HORAS EXTRAS. ECONOMIÁRIO. OPÇÃO 
Os servidores da Caixa Econômica Federal têm a jornada de trabalho de seus servidores fixada em legislação própria, onde se faculta o direito de opção. manifestada a vontade pelo regime de quarenta horas semanais, de modo livre e no interesse do próprio empregado, descabe invocar os arts. 224 e 468 da CLT e art. 153, parág. 1º, da CF, objetivando o pagamento de horas extraordinárias. 
Sentença confirmada.' (RO 6743/MG, Rel. Min. William Paterson, TFR 2ª T., DJU 19.09.85, pág. 15883). 
'RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. ECONOMIÁRIO. JORNADA DE TRABALHO. 
A jornada de trabalho, a que está submetido o economiário, é a definida pelos Decretos-lei nºs 266 e 943, com o permissivo da Lei nº 6718/69. Sentença confirmada.' (RO 6586/MG, TFR 2ª T. Rel. Min. José Cândido, DJU 28.06.84, Pág. 10566). 
....................................................................................................... 
Fls. 527/528: 
'EMENTA TRABALHISTA. 
Reclamação trabalhista, com o objetivo de reintegração no cargo de Caixa da Caixa Econômica Federal. Inexistência desse cargo na mencionada empresa. Pelo regulamento de pessoal desta as funções de confiança são definidas pela Diretoria (nº 204). Entre as desta categoria, de confiança, se inclue a de Caixa, para cujo exercício pode ser admitido ou dispensado qualquer servidor, mediante ato do Presidente. 
A reversão do emprego ao cargo efetivo, por ter sido dispensado da função de confiança, no caso de Caixa, não constitui alteração unilateral do contrato de trabalho, ut art. 468, parágrafo único da CLT.' (RO 1388/RS, Rel. Min. Adhemar Raymundo, Rec.te José Teixeira de Moura, Rcda. CEF, DJ 15.10.81).' 
(...)" (sic). 
Como se vê, o recurso não foi conhecido por aplicação da Súmula 7/STJ, anotando-se, ainda, alguns precedentes do TFR em harmonia com o então acórdão recorrido. 
Tais precedentes, contudo, consideravam soberana a empregadora (CEF), para decidir sobre a classificação dos cargos como de confiança, o que, como já exposto, não pode ser aceito, tendo-se em conta o princípio protetivo. 
Além disso, há de se conferir maior relevância às conclusões da Justiça do Trabalho sobre a função exercida pelo Caixa bancário (matéria até sumulada - E. n. 102), pois, sendo especializada, detém maior conhecimento acerca das atribuições de empregados e das práticas utilizadas por empregadores ao estabelecerem funções de confiança. 
Forte em tais razões, NÃO CONHEÇO do recurso especial. 
É o voto. 
CERTIDÃO DE JULGAMENTO 
TERCEIRA TURMA 
Número Registro: 2000/0021375-6 RESP 250285 / MG
Números Origem: 32281 8901224062 
PAUTA: 07/11/2002 JULGADO: 07/11/2002
 
Relatora 
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI 
Presidente da Sessão 
Exmo. Sr. Ministro ARI PARGENDLER 
Subprocurador-Geral da República 
Exmo. Sr. Dr. HENRIQUE FAGUNDES 
Secretária 
Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO 
AUTUAÇÃO 
RECORRENTE:   CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
ADVOGADO:      JOSÉ GOMES DE MATOS FILHO E OUTROS
RECORRIDO:      LUCAS ANTUNES
ADVOGADO:      PAULO EMÍLIO RIBEIRO DE VILHENA E OUTRO
ASSUNTO:         Trabalho - Contrato - Reclamação 
CERTIDÃO 
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: 
"A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial." 
Os Srs. Ministros Castro Filho, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. 
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. 
O referido é verdade. Dou fé. 
Brasília, 07 de novembro de 2002 
SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO 
Secretária
Documento: 382252 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 02/12/2002

Serviço de Jurisprudência e Divulgação