CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

RESOLUÇÕES


RESOLUÇÃO Nº 305, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2019
Disponibilizada no DJe em 18/12/2019

Estabelece os parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário.


O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais;

CONSIDERANDO que compete ao CNJ zelar pela autonomia e independência do Poder Judiciário, pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura e pela observância do art. 37 da Constituição Federal, notadamente os princípios da impessoalidade e da moralidade, podendo, para tanto, expedir atos regulamentares, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO que é dever do Estado assegurar que os magistrados possam "decidir todos os casos que lhes sejam submetidos com imparcialidade, baseando-se nos fatos e em conformidade com a lei, sem quaisquer restrições e sem quaisquer outras influências, aliciamentos, pressões, ameaças ou intromissões indevidas, sejam diretas ou indiretas, de qualquer setor ou por qualquer motivo" (Resolução nº 40/32, de 29 de novembro de 1985, da Assembleia Geral das Nações Unidas, que assentou os Princípios Básicos Relativos à Independência da Magistratura);

CONSIDERANDO o disposto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional no Código de Ética da Magistratura Nacional, nos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial e no Código Ibero-Americano de Ética Judicial;

CONSIDERANDO o teor das diretrizes éticas a respeito do uso das redes sociais por magistrados expedidas pela Comissão Ibero- Americana de Ética Judicial e pela Rede Global de Integridade Judicial;

CONSIDERANDO que a integridade de conduta do magistrado fora do âmbito estrito da atividade jurisdicional contribui para uma fundada confiança dos cidadãos na judicatura, impondo-lhe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral (arts. 15 e 16 do Código de Ética da Magistratura Nacional);

CONSIDERANDO que a atuação dos membros do Poder Judiciário deve ser pautada pelos valores da independência, da imparcialidade, da transparência, da integridade pessoal e profissional, da idoneidade, da dignidade, honra e decoro, da igualdade, da diligência e dedicação, da responsabilidade institucional, da cortesia, da prudência, do sigilo profissional, do conhecimento e capacitação;

CONSIDERANDO a multiplicidade de tecnologias digitais e a forma como as variadas plataformas de mídias e redes sociais transformaram a comunicação na sociedade, ampliando a possibilidade de interação com distintos públicos-alvo e o modo como as informações são coletadas, divulgadas e assimiladas, permitindo manifestações com alcance amplificado, difuso, indefinido e com efeitos permanentes e incontroláveis;

CONSIDERANDO os profundos impactos, positivos e negativos, que a conduta individual do magistrado nas redes sociais pode acarretar sobre a percepção da sociedade em relação à credibilidade, à legitimidade e à respeitabilidade da atuação da Justiça;

CONSIDERANDO que a confiança da sociedade no Poder Judiciário está diretamente relacionada à imagem dos magistrados, inclusive no uso que fazem das redes sociais fora do âmbito estrito da atividade jurisdicional;

CONSIDERANDO que a manifestação de pensamento e a liberdade de expressão são direitos fundamentais constitucionais dos magistrados que, por não serem absolutos, devem se compatibilizar com os direitos e garantias constitucionais fundamentais dos cidadãos, notadamente o direito de ser julgado perante um Poder Judiciário imparcial, independente, isento e íntegro;

CONSIDERANDO os riscos à segurança pessoal e à privacidade dos magistrados e de seus familiares relacionados com o uso das redes sociais, com a exposição de informações e dados relacionados à vida privada, sem as devidas precauções;

CONSIDERANDO a necessidade de formação profissional específica e de atualização dos magistrados sobre a natureza e o funcionamento das tecnologias digitais e das plataformas das mídias sociais, assim como seus riscos e implicações, particularmente sob a égide da independência, da imparcialidade judicial, da isenção dos julgamentos e da dignidade do cargo e da Justiça;

CONSIDERANDO a deliberação do Plenário do CNJ, no Procedimento de Ato nº0004450-49.2019.2.00.0000, na 302ª Sessão Ordinária, realizada em 17 de dezembro de 2019;

RESOLVE:

CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Estabelecer os parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário, de modo a compatibilizar o exercício da liberdade de expressão com os deveres inerentes ao cargo.

Art. 2º O uso das redes sociais pelos magistrados deve observar os preceitos da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, do Código de Ética da Magistratura Nacional, os valores estabelecidos nos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial e o disposto nesta Resolução.

Parágrafo único. Consideram-se rede social todos os sítios da internet, plataformas digitais e aplicativos de computador ou dispositivo eletrônico móvel voltados à interação pública e social, que possibilitem a comunicação, a criação ou o compartilhamento de mensagens, de arquivos ou de informações de qualquer natureza.

CAPÍTULO II
DAS DIRETRIZES DE ATUAÇÃO DOS MAGISTRADOS NAS REDES SOCIAIS

Seção I

Das Recomendações de Conduta

Art. 3º A atuação dos magistrados nas redes sociais deve observar as seguintes recomendações:

I – Relativas à presença nas redes sociais:

a) adotar postura seletiva e criteriosa para o ingresso em redes sociais, bem como para a identificação em cada uma delas;

b) observar que a moderação, o decoro e a conduta respeitosa devem orientar todas as formas de atuação nas redes sociais;

c) atentar que a utilização de pseudônimos não isenta a observância dos limites éticos de conduta e não exclui a incidência das normas vigentes; e

d) abster-se de utilizar a marca ou a logomarca da instituição como forma de identificação pessoal nas redes sociais.

II – Relativas ao teor das manifestações, independentemente da utilização do nome real ou de pseudônimo:

a) evitar expressar opiniões ou compartilhar informações que possam prejudicar o conceito da sociedade em relação à independência, à imparcialidade, à integridade e à idoneidade do magistrado ou que possam afetar a confiança do público no Poder Judiciário;

b) evitar manifestações que busquem autopromoção ou superexposição;

c) evitar manifestações cujo conteúdo, por impróprio ou inadequado, possa repercutir negativamente ou atente contra a moralidade administrativa, observada sempre a prudência da linguagem;

d) procurar apoio institucional caso seja vítima de ofensas ou abusos (cyberbullying, trolls e haters), em razão do exercício do cargo;

e) evitar expressar opiniões ou aconselhamento em temas jurídicos concretos ou abstratos que, mesmo eventualmente, possam ser de sua atribuição ou competência jurisdicional, ressalvadas manifestações em obras técnicas ou no exercício do magistério; e

f) abster-se de compartilhar conteúdo ou a ele manifestar apoio sem convicção pessoal sobre a veracidade da informação, evitando a propagação de notícias falsas (fakenews).

III – Relativas à privacidade e à segurança:

a) atentar para o fato de que o uso das redes sociais, sem as devidas precauções, e a exposição de informações e dados relacionados à vida profissional e privada podem representar risco à segurança pessoal e à privacidade do magistrado e de seus familiares;

b) conhecer as políticas, as regras e as configurações de segurança e privacidade das redes sociais que utiliza, revisando-as periodicamente; e

c) evitar seguir pessoas e entidades nas redes sociais sem a devida cautela quanto à sua segurança.

Parágrafo único. É estimulado o uso educativo e instrutivo das redes sociais por magistrados, para fins de divulgar publicações científicas, conteúdos de artigos de doutrina, conhecimentos teóricos, estudos técnicos, iniciativas sociais para a promoção da cidadania, dos direitos humanos fundamentais e de iniciativas de acesso à justiça.

Seção II

Das Vedações

Art. 4º Constituem condutas vedadas aos magistrados nas redes sociais:

I – manifestar opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério (art. 36, inciso III, da Loman; arts. 4º e 12, inciso II, do Código de Ética da Magistratura Nacional);

II – emitir opinião que demonstre atuação em atividade político-partidária ou manifestar-se em apoio ou crítica públicos a candidato, lideranças políticas ou partidos políticos (art. 95, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal; art. 7º do Código de Ética da Magistratura Nacional);

III – emitir ou compartilhar opinião que caracterize discurso discriminatório ou de ódio, especialmente os que revelem racismo, LGBT-fobia, misoginia, antissemitismo, intolerância religiosa ou ideológica, entre outras manifestações de preconceitos concernentes a orientação sexual, condição física, de idade, de gênero, de origem, social ou cultural (art. 3º, inciso IV, da Constituição Federal; art. 20 da Lei nº 7.716/89);

IV – patrocinar postagens com a finalidade de autopromoção ou com intuito comercial (art. 95, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal; art. 36, inciso I, primeira parte, da Loman; art. 13 do Código de Ética da Magistratura Nacional);

V – receber patrocínio para manifestar opinião, divulgar ou promover serviços ou produtos comerciais (art. 95, parágrafo único, inciso IV, da Constituição Federal; art. 17 do Código de Ética da Magistratura Nacional); e

VI – associar a sua imagem pessoal ou profissional à de marca de empresas ou de produtos comerciais (art. 95, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal; art. 36, inciso I, primeira parte, da Loman; art. 13 do Código de Ética da Magistratura Nacional).

§ 1º Para os fins do inciso II deste artigo, a vedação de atividade político-partidária não abrange manifestações, públicas ou privadas, sobre projetos e programas de governo, processos legislativos ou outras questões de interesse público, de interesse do Poder Judiciário ou da carreira da magistratura, desde que respeitada a dignidade do Poder Judiciário.

§ 2º A divulgação de obras técnicas de autoria ou com participação do magistrado, bem como de cursos em que ele atue como professor, não se insere nas vedações previstas nos incisos IV, V e VI, desde que não caracterizada a exploração direta de atividade econômica lucrativa.

Seção III

Da abrangência das recomendações e vedações

Art. 5º As recomendações e vedações previstas nesta Resolução aplicam-se também aos magistrados afastados por questões disciplinares ou em disponibilidade.

Art. 6º As recomendações e vedações previstas nesta Resolução não se aplicam aos magistrados representantes legais e demais diretores das entidades e associações de classe, durante o exercício de seus mandatos, que poderão se manifestar nas redes sociais, com vistas à representação dos interesses dos associados, bem como na defesa dos interesses de classe, no debate de temas de interesse público nacional e na defesa do Estado Democrático de Direito.

Seção IV

Das ações de capacitação

Art. 7º As Escolas divulgarão informes contendo orientações e promoverão eventos e cursos voltados à capacitação dos magistrados nos temas das novas tecnologias e ética nas redes sociais, em suas diversas perspectivas, sob coordenação da Enfam e da Enamat, que definirão o conteúdo mínimo e o prazo de implementação em todos os Tribunais, assim como promoverão a inserção do tema de forma permanente em todas as fases da formação profissional.

Art. 8º A Comissão de Eficiência Operacional e Gestão de Pessoas estabelecerá, no prazo de 30 dias, diretrizes para capacitação de âmbito nacional dos servidores, incumbindo ao CEAJud o desenvolvimento e o oferecimento de curso na modalidade de educação a distância, no prazo de 120 dias.

CAPÍTULO III

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 9º Os tribunais manterão serviços de comunicação social para oferecer apoio técnico-profissional aos magistrados, especialmente para a atuação em casos sob julgamento que tenham ampla repercussão na mídia ou nas redes sociais e, se for o caso, possibilitar o auxílio previsto no art. 3º, inciso II, alínea ‘d’.

Art. 10. Os juízes que já possuírem páginas ou perfis abertos nas redes sociais deverão adequá-las às exigências desta Resolução, no prazo de até seis meses contados da data de sua publicação.

Art. 11. A Corregedoria Nacional de Justiça e as demais Corregedorias acompanharão o cumprimento desta Resolução.

Art. 12. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.


Ministro DIAS TOFFOLI




Secretaria de Gestão Jurisprudencial, Normativa e Documental.
Última atualização em 18/12/2019